Regina Célia é escritora, formada em Letras, membro da AMULMIG _ Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, autora dos Livros Gangorra e Ad versos, alem de crônicas publicadas em jornais e em posts.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Rompendo Barreiras


O destino do ser humano é esse: romper barreiras... Romper barreiras desde que se nasce... Sempre alguém fica para trás... Sempre alguém desiste... Alguém sempre é reprovado, alguém sempre é derrotado!
Mas que sociedade é essa de notórios conhecimentos capaz de derrotar, excluir, reprovar ...? Em que local está a perfeição e quem assim a denominou?
Se a religião, a cor da pele, a opção sexual, a idade, o peso ou a altura são fatores que promovem a exclusão, a marginalização e ergue barreiras sociais alguém poderia dizer qual a religião certa, a cor da pele certa, a opção sexual certa, o peso e a altura corretos? Como explicar o fenômeno do rompimento de barreiras tidas por indestrutíveis aos olhos medíocres da sociedade?
Acordar a cada manhã para viver um novo dia é se preparar para romper barreiras. No meu caso é! A minha casa é adaptada para as dificuldades de locomoção da minha mãe, mas eu também pego carona nessas adaptações. Para lavar os pés, preciso da barra de apoio que foram colocadas para ela, senão não consigo. Escada tem que ter corrimão! Não posso pegar a lotação porque os ônibus sempre param bem afastados dos passeios e a altura do degrau do ônibus não permite que eu me apóie em uma perna com todo meu peso para entrar... Sair a pé é bem mais cansativo e demorado, mas menos constrangedor.
Comprar roupas era vergonhoso, incômodo e revoltante. As lojas não vendiam nada que tivesse uma numeração superior a 48 e essa numeração não me vestia e nem veste! Eu era obrigada a usar umas roupas que pareciam um pacote enorme, aberto embaixo e com 3 buracos simétricos na parte superior. Chamavam a isso de roupa de gorda!
Poxa, não trabalhar a sensualidade, o decote, a transparência, os detalhes numa peça de vestuário apenas porque ela gasta mais tecido é, no mínimo, desrespeitoso!
Hoje é menos penoso, algumas lojas se dedicam a atender ao enorme público dos gordos e trabalham numerações que chegam até o 80! Roupas joviais, leves, sensuais, elegantes e que vestem as gordinhas, as gordas e as gordonas sem o menor problema! O público plus size agradece a sensatez...
É preciso romper barreiras e chegar lá. Todos os dias! Ytisteza? Pra que? A alegria deve se fundar em cada um... O sorriso destrói barreiras.é preciso curvar, é preciso saber-se cumpridor da própria missão de ser feliz...
Adélia Prado, em sua “ Com licença Poética”, exalta a missão da mulher: “Quando nasci um anjo esbelto,desses que tocam trombeta, anunciou:vai carregar bandeira. Cargo muito pesado pra mulher,esta espécie ainda envergonhada.//Aceito os subterfúgios que me cabem, sem precisar mentir. Não sou tão feia que não possa casar, acho o Rio de Janeiro uma beleza e ora sim, ora não, creio em parto sem dor.// Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina. Inauguro linhagens, fundo reinos-- dor não é amargura.//Minha tristeza não tem pedigree,já a minha vontade de alegria,sua raiz vai ao meu mil avô.Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.Mulher é desdobrável. Eu sou.”
Adooooroooooooo !

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Pra Quando o Carnaval Chegar


A banalização da alegria, a banalização da música, a banalização do corpo, da roupa, da saúde... Tudo é normal, tudo é permitido... Desde que se use a camisinha! Não saia sem ela. Afirmam os discursos permissivos do governo. Sem ela não dá! Apregoam as ONGs, Camisinha na folia é nota dez em harmonia... Aff!!!

Sem noção! Cismam em proclamar que se você curte a folia, vai transar... E eu em casa, ouvindo o Chico cantando Quando o carnaval chegar.

A festa começa na sexta e vai até a madrugada de quarta-feira, quando os foliões deixam as ruas e vão se encontrando com as beatas que se dirigem para o recebimento de cinzas na igreja.

Paaaaara tuuuuuudddddooo!!!


O beijo roubado não é mais permitido. É caso até de policia! “Há quanto tempo desejo seu beijo molhado de maracujá...”Até eu que não curto a folia, não apóio a banalização do sexo, da música, do corpo, das roupas, da saúde e não sou contra o beijo roubado lamento o fim da festa momesca.

É uma pena, mas acabou. “ Eu tenho tanta alegria, adiada, abafada, quem dera gritar...”

Pulei todos os dias na minha cama fofa e aconchegante. “Quem me vê sempre parado,distante garante que eu não sei sambar...” Não tenho paciência pra televisão e nem aos desfiles do Rio ou de São Paulo eu assisti. Tomei conhecimento da baderna da apuração em São Paulo pelo face book... Essas redes não perdem nada!

To me guardando pra quando o carnaval chegar!”

Aqui virou moda dizer “é meu jeito moleque de ser”... Tudo isso em referencia à banda que abriu nosso carnaval e que , pelo visto, o povo curtiu à beça!

“E quem me vê apanhando da vida, duvida que eu vá revidar...Tô me guardando pra quando o carnaval chegar!”

Agora a vida volta ao normal. Ou, em muitos casos, começa o ano... No Brasil o ano novo, em geral, começa após o carnaval. É A banalização do tempo. Yes, nós temos bananas!

As marchinhas da Praça Nossa Senhora Aparecida ainda vão ecoar por toda quaresma na cabeça dos foliões... Banana menina, tem vitamina... Banana engorda e faz crescer!

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Crisálida


A vida é feita de ciclos. Isso todos sabem. O que poucos sabem é reconhecer esses ciclos na prática, é reconhecer-se na metamorfose própria de cada ciclo.

Metaforicamente, borboleteamos durante toda a vida! Passamos por cada etapa de nossas vidas seguindo os mesmos ciclos de vida da borboleta: 1) ovo / fase pré-larval 2) lagarta;3) pupa / que se desenvolve dentro da crisálida;4) imago / fase adulta

A Borboleta passa a maior parte da vida em estado de larva (lagarta), alimentando-se de folhas. Enquanto crescem e se desenvolvem, as lagartas trocam várias vezes de pele até se transformarem em pupa, ou seja, quando sua pele endurece e forma um casulo.

No interior do casulo (crisálida), a pupa não se alimenta, move-se raramente e transforma-se em Borboleta adulta.

Após um período que pode variar de duas semanas até vários meses, segundo a espécie, a Borboleta rompe o casulo.

Geralmente, quando surge uma nova situação, podemos considerar que estamos na fase 1 da metamorfose. Enquanto digerimos a nova situação e tentamos – em vão- obter respostas vivemos a fase 2. Aí percebemos que é preciso dar tempo ao tempo e nos recolhemos para não tomar atitudes precipitadas (fase 3). Após um relativo período em que a poeira se assenta e conseguimos amadurecer com a nova situação, saímos prontos para viver de uma nova maneira, melhor e mais bonitos! (fase 4)

A cada novo ciclo adquirimos mais resistência e novas roupagens. Somos diretamente afetados pelas mudanças e somos renovados por cada uma delas.
As borboletas são símbolos de liberdade, alegria, leveza, ligeireza, riqueza... No Brasil, sonhar com borboletas é bom presságio(no jogo do bicho corresponde ao número 4), Nos EUA, soltar borboletas num casamento ou divórcio significa disponibilidade para uma nova vida; Na china, a mulher é simbolizada pela borboleta, por sua especial ligeireza e delicadeza;Na França, uma borboleta é anúncio de boas novas; Na Grécia as borboletas são diretamente ligadas à evolução espiritual.

Entendo que, por seu simbolismo e beleza, minha irmã Luciana as ame tanto! Seu quarto é quase um borboletário artificial; Sua pele as tem marcadas para todo o sempre... Ela própria uma metamorfose em evolução... Hoje muito mais bonita que quando ovo ou larva. Hoje adulta, livre, madura, soberana e voejante.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Super Proteção


Na minha vida não me inspirei em super heróis. Nem quando era criança. Achava aquelas roupinhas dos ditos heróis sempre muito ridículas! O super homem usa cueca em cima da calça, a mulher maravilha usa cinto largo com short e um diadema na cabeça... Brega demais! Tarzan, Flash Gordon, Batman, Capitão América, Homem de Ferro, O Coisa (e que coisa, viu!)... Todos na defesa do bem, da paz, no combate ao crime, tomando para si a responsabilidade de ser protagonista na luta do bem contra o mal. Fardo muito pesado para um ser humano. A mulher invisível era tudo o que eu não queria ser. O Zorro dispensaria qualquer comentário se não tivesse sido copiado pela Tiazinha... rs rs, Chapolin Colorado é bizarro, mas amava o Lion dos Thundercats... Esse sim, um gato!

Agora, depois de crescida, sei que tinha razão. Heroísmo é coisa de bombeiro... Mas alguns pequenos poderes é-nos concedido sim e vivemos a tentar colocá-los em prática!

Tentar voltar o tempo não nos é possível. O que passou, passou (e tudo passa!).

Queria, porém, aprisionar algumas coisas que me fazem bem, que me dão quentura n’alma. Pus-me então a construir um espaço de proteção para algumas coisas – poucas- que não desejo perder. Criei uma redoma para guardar aquele sorriso de Clara, a rosa estronda mundo do jardim de mamãe, a doce voz de Melissa, o cheiro do doce de cidra, a minha primeira visão do mar, o beijo na mão... Lembranças que afagam meu coração por dentro e de que eu cuidarei por toda vida, a fim de que nenhum mal lhes suceda.

Diz a musiquinha da Banda Mais bonita da Cidade que “coração não é tão simples quanto pensa, nele cabe o que não cabe na despensa, cabe o meu amor”. Assim, heroicamente criei uma redoma de pura energia pela qual nada pode passar além da ternura de quem vê. Uma redoma que guardo no mais aconchegante cantinho do meu coração, aonde só pode chegar quem tem a chave.

Trouxeste a tua?

Expiação


O céu de estrelas cintilantes pode nos levar a sonhos, pode nos levar ao encantamento e pode nos levar ao completo êxtase contemplativo. Esse é o céu de pós chuva numa noite de verão de Barão de Cocais. A lua não apareceu... É muito nova pra sair a essa hora de quase completa solidão, alguns boêmios que não se percebem sós, pois conversam com alguém que não vemos, passam inertes àquela pequena luminosidade piscante nas alturas. O cigarro é um companheiro e tanto nessas horas em que assistimos ao nada na mais profunda exaustão do tédio.

Só assim mesmo para terminar o dia depois de driblar contra o vento sul desde a manhã. Tenho um amigo que se refere a esse tipo de dia dizendo que levantou com o pé esquerdo. Mas, graças a Deus! Penso nessas horas. Levantar sem ele seria pior! Hoje, no entanto levantei com os dois pés virados para trás. Era a própria versão feminina do Curupira! Meus cabelos acordaram muito antes de mim e estavam todos de pé. A empregada não apareceu pra trabalhar, o pão na mesa do café era amanhecido e a manteiga tinha acabado no purê de batatas de ontem. A ração dos cachorros também se rendeu ao fim e a água da Copasa foi interrompida por causa das obras de infra estrutura que estão sendo feitas na minha rua.

Nada há de tão ruim que não possa piorar, não é mesmo? Assim ocorreu então no serviço. Deu tilt no sistema, a net entrou em manutenção de emergência, a procuradoria jurídica deu pau na minuta da defesa elaborada para sustentar a defesa de um projeto, o estagiário faltou ao serviço, um desprivilegiado de bom senso resolve reclamar porque apareceu na foto de m um jornal de olhos fechados, a outra, ao contrario, que espirrou de olhos abertos quer o meu anel que imita águas marinhas, mas que fora comprado na loja de R$1,75. A vizinha desorientada resolve brigar com o filho pelo celular, mas todos os companheiros são obrigados a escutar, até quem esta do outro lado da rua. Enfim, um cheiro bom de café lembra que nem tudo está perdido. Pura ilusão! O café está fraco e doce. As principais operadoras de celular estão sem sinal, menos uma, é claro. Claro também que ninguém usa essa operadora, exceto o plano corporativo do serviço.
O dia parecia interminável. Era capaz de chegar as 20 horas, mas as 18 não chegavam nunca. Quantos aborrecimentos ainda por vir...

Mas a noite chega e com ela a calmaria típica de mares turbulentos. Por cima mansidão, por baixo o perigo.

Estrelas piscando uma após a outra. Cigarro aceso um após o outro. Bêbados que falam sozinhos. Cachorros que passam devagar... Nenhuma janela espia!

ETA vida besta, meu Deus! Já disse outrora o velho Drummond a respeito de “Uma cidadezinha qualquer”, mas é claro que não se referia a Barão de Cocais , que não é uma cidadezinha qualquer...