Às vezes as rajadas do vento são fortes e nos despenteiam Os raios
repicam entre os nossos passos em chicotadas de fogo e até a chuva não se
despeja em forma líquida, atingindo-nos com pedradas de gelo. É ... Esses são
dias em que nos sabemos lagartas! Feias, asquerosas, até meio nojentas!
Extremamente solicitarias e carentes. Às vezes de fogo, que deseja um afago mas
a ousadia humana não permite o acariciar dos pelos de uma taturana!
O cachepô do muro, recoberto de verbenas coloridas constitui o abrigo ideal
contra o vento e a fúria das tempestades.
Dezenas de lagartas percorrem o mesmo caminho em busca de abrigo e logo
um dormitório de casulos é inaugurado no muro de casa.
Ponho-me a observar a ansiosa busca do recolhimento escuro e só. Quando
em estado de casulo, mesmo com a dor da transformação solitária, vida nova,
mais alegre e colorida é preparada na
tessitura frágil de um par de asas.
Em poucos dias a escuridão começa a translucidar-se e um novo ciclo de
vida já pode ser visto. Ao romper-se o casulo nada se vê que remonte à
lembrança da feia lagarta de fogo.
Na clausura de meu quarto-casulo teço asas às palavras e nas rimas de um
poema sonho-me borboleta.