Regina Célia é escritora, formada em Letras, membro da AMULMIG _ Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, autora dos Livros Gangorra e Ad versos, alem de crônicas publicadas em jornais e em posts.
quarta-feira, 18 de maio de 2011
Trocando em miúdos
Ah, bonito quando a simplicidade faz alguém dizer diante de uma ostentação que não lhe apetece “nem me bateu (tremeu, abanou) a passarinha!” Mas espera lá... Passarinha seria o feminino de passarinho? Seria lindo, poético até se fosse esse o seu significado, mas não é.
Para compreendermos melhor, vamos a uma pequena incursão médica : “ O baço é um órgão linfóide situado no hipocôndrio esquerdo, abaixo do diafragma, atrás do estõmago e pesa em média 200 g, possui a cor arroxeada, forma ovóide alongada e cabe na palma da mão, com cerca 12 cm de comprimento e 8 cm de largura.. Acha-se envolvido por uma cápsula fibrosa, que o divide em lóbulos, por meio de tabiques - os septos conectivos - que formam uma estrutura de sustentação, e nos quais existem fibras musculares lisas, responsáveis pela contração e pela distensão do órgão...”.......... (vide bula)
Na nossa cultura, o baço é também chamado de passarinha. Fosse Drummond a escrever, optaria pelos seus versos do Poema de sete faces e rasgaria, sem temor um “Mundo, mundo vasto mundo/se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução”... Pra entender esse mundo vasto seria preciso ler Drummond, Humberto Eco, o Midrash, o Zohar????(não necessariamente nessa mesma ordem)
Ao dizer que não lhe bateu a passarinha, a pessoa, provavelmente sem saber, remete-se a um fato cultural proveniente da cultura hebraica, em cujo Midrash, livro da tradição histórica, inclui o baço entre os 10 órgãos que contêm a alma. Isto se deve à assertiva, proveniente do Zohar, outro famoso livro do misticismo hebraico, segundo a qual “o baço produz o riso e a alegria”.
A culinária brasileira conta com diversos pratos que possuem em seus ingredientes a passarinha (o sarapatel, por exemplo, que é uma bela mistura de miúdos de porco, ou a passarinha de boi frita...).
Trocando em miúdos, queremos ver e sentir tremer nossa passarinha com a chegada de um amigo, com a vitória de nosso time, com a presença de um amor, com o restabelecimento da saúde...
E é isso! Quando não bate a passarinha, a pessoa não sentiu alegrar-se a alma, não se entusiasmou, não teve tesão. Donde nos vem a (in)consciência de que o baço, dentre suas funções possui a de sinalizar a alegria e o riso... Eis um rápido diagnóstico para a depressão e o mau humor... Problemas no baço!
sábado, 7 de maio de 2011
Olhos que me fitam
Tenho às vezes um olho científico, que mira o céu de Galileu. Em outras ocasiões, o céu é o mesmo, mas o olho é de apaixonado, que mira todas as estrelas e sente-se dono de cada uma delas.
Por outras vezes tenho um olhar de cobra, que paralisa o outro olhar num transe hipnótico. Não raro, tenho o olho de peixe morto, inexpressivo, perdido no espaço, no mundo do sonho, fora da realidade...
O olho do bicho-papão me metia muito medo e o olho do furacão me assusta até hoje!
Olho de sogra é uma delícia calórica. Detesto o olho de seca pimenteira e, para detê-lo, uso o olho de tigre no peito.
Olhos de santo têm que ser perfeitos, ternos e complacentes! Como não sou santa, uso óculos (ás vezes escuros) e me escondo por trás de suas lentes.
Sempre de olho vivo nos sinais da sorte, já tive um vaso de trevo de quatro folhas! Morreu de olho gordo...
Como boa e autêntica mineira que sou, aprendi a desconfiar. Fico sempre com um olho no peixe e o outro no gato... Álvaro de Campos, diretamente do albergue de Fernando Pessoa, outorga a sua dúvida com olho de inquisidor: “Gato que me fitas com olhos de vida, quem tens lá no fundo?”
terça-feira, 3 de maio de 2011
Pé de pato, mangalô três vezes!
Como se não bastassem as mortais curvas da BR 381, nas quais a gente fica cara a cara com “a indesejada das gentes” - apregoada por Bandeira - com a interdição da velha ponte sobre o Rio das Velhas, os desvios são inevitáveis para quem precisa chegar à capital mineira pela 381.
Sem o romantismo piegas da musica de Roberto Carlos “Nas curvas da estrada de Santos”, acabo de aventurar-me nas curvas da estrada que liga Caeté a Sabará.Segundo as más línguas, a estrada fora projetada por topógrafos e engenheiros “zoiudos” que eram pagos por curva executada. Valham-nos Nossa Senhora do Bonsucesso e Nossa Senhora do Ó, porque trafegar naquele trecho é mesmo o Ó!
A estrada é absolutamente estreita, o tráfego hiper, mega, ultra intenso, sem orientação policial, do Dnit ou do DER o trânsito se engastalha todo no momento em que surge uma carreta, caminhão ou ônibus. As filas de veículos serpenteiam nas tantas curvas da estradinha e a visão da paisagem é deslumbrante! Nenhuma lanchonete, posto de gasolina ou bar em todo o trecho e nessas horas, a bexiga quase estoura.
Lembra-se que uma rodovia destruída pelo terremoto do dia 11 de março em Naka, na província de Ibaraki, no norte do Japão, foi reconstruída, em apenas SEIS DIAS pela empresa responsável, que recuperou um trecho de 150 metros que faz ligação com a capital Tóquio?
Informações – poucas – nos dão conta que a ponte deverá ser devolvida para uso num prazo aproximado de SEIS MESES, o que nos faz desejar que a empresa contratada para a obra seja todinha formada por japoneses... Por via das dúvidas, alguns patuás poderiam ajudar a afastar o olho grande e talvez diminuindo o tamanho dos olhos, diminua também o prazo de execução da obra.
Eu passarinho
Alguém que demonstre uma simples alegria, sem motivo aparente é identificado como alguém que viu “passarim verde”. Sim, a expressão sobrevive há alguns séculos e segundo Câmara Cascudo (Locuções Tradicionais no Brasil) remete ao tempo do uso dos periquitos como portadores de mensagens de casais enamorados, assim como uma lenda do século 19, segundo a qual as moças avisavam seus namorados do envio de cartas de amor colocando um periquito perto da grade da janela. Assim, a simples visão do pássaro acalentava a esperança de uma noticia da pessoa amada e botava-lhe um sorriso no rosto.
Pois bem, essa incursão histórica/folclórica é só pra registrar que hoje não vi um pasarim verde... Sim, eu que sempre tive um sorriso no rosto acabei de descobrir que o principal motivo é porque tinha um passarim verde. Desde menina sempre tive um, dois, três periquitinhos... Dany, Quico e Aninha. Daniele e Quirino viraram comida de gato. Aninha fugiu. E eu chorei por todos eles.
Depois ganhei o Teteco, uma maritaca macho , que vivia sob cuidados veterinários por causa do stress e da carência de vitaminas... Arrancava todas as penas de seu corpo e sangrava...Morreu de infarto após sete anos de convivência e quase me matou de tristeza e pranto.
Ganhei a Frida, que ficou apenas 3 anos comigo e se escafedeu em um vôo ingrato para nunca mais voltar. Quase me acabei em lágrimas.
Poucos dias depois da fuga de Frida, ganhei a Teteca, que deu um berro com a morte hoje e me deixou. Sete anos depois de estar comigo. Parece sina cabalística, não é mesmo?
Não sei explicar, mas em minhas investiduras terapêuticas, era sempre posto em análise um sonho recorrente, no qual eu batalhava horrores para aprisionar um passarim verde e nao o conseguia... Há anos não sonho com essa desventura.
Ao retornar de uma pequena viagem, deparei-me com o poleiro de Teteca vazio e nos rostos compadecidos de toda família o receio em dar-me a noticia.
Hoje não vi meu passarim verde. Talvez as lágrimas estejam me embaçando as retinas. Ah Quintana, quão bem me disses! “Todos esses que aí estão atravancando o meu caminho, eles passarão.. Eu passarinho!”
segunda-feira, 2 de maio de 2011
Quem procura...
Quem perde o trem se entristece e faz triste os que o aguardam. Quem perde a felicidade, mais que aquele que perdeu o trem fica triste. Quem perde a cabeça faz besteira, inevitavelmente. Entristece-se quem perde o emprego, quem perde o amor, quem perde dinheiro, quem perde a vontade de viver... Perder quase sempre é sinônimo de tristeza para si e para os que amam o perdido ou o perdedor.
Amar o perdido deixa confundido o meu coração também Drummond! E no olho do furacão rodopio vertiginosamente, tremo de frio, tremo de medo e choro sem tristeza.
Se eu perder os dentes, não sorrio mais. Juro!
Se eu tivesse felicidade a ponto de perdê-la, acho que diria que a estava partilhando. Se eu perdesse alguns quilos... Não. Se eu perdesse algumas arrobas acho que ninguém veria tristeza no meu rosto por esse motivo.
Procuro um amor que não perdi, a felicidade que ainda não alcancei, o caminho que não foi perdido porque nem sei se existe... Não perdi o trem, não sou trem (mas ando nos trilhos), já perdi a cabeça (e fiz besteiras) várias vezes e ainda assim não me perdi. Continuo procurando. Procurar e não encontrar é passível de penalização e o agravante é que mesmo não tendo me perdido, não fui encontrada...
O pior mesmo foi descobrir que as mulheres perdidas é que são as mais procuradas!!!
Sobre vinhos e vidas
Nunca li o Alcorão, mas recordo-me uma sua citação “uma gota de álcool não beberás”. Sempre notei a atitude de diversos bebuns que seguiam piamente a recomendação e ofereciam uma mísera gotinha ‘ao santo’. Bom já se vão quase sete anos que não coloco a famosa gota na minha boca também, mas conviver com os apreciadores das bebidas alcoólicas não me incomoda. Mês de Maio é mês de Festa do Vinho na cidade vizinha de Catas Altas.
Do vinho mesmo não dou noticia, mas a programação musical é, geralmente, impecável. Coisa para pessoas de bom gosto e refinado paladar musical. Os melhores shows aos quais estive presente foram lá, na Pequenópolis Catas Altas.
Atmosfera convidativa ao aconchego, pé de serra, casario histórico, igrejas seculares, vinho, gente bonita e musica de boa qualidade. Ingredientes perfeitos para o sucesso da festa.
Verificando a programação deste ano, uma sensação de êxtase tomou conta de algum lugar dentro de mim ao constatar o encerramento com O Teatro Mágico. O Teatro Mágico é uma mistura de circo, poesia e discussões políticas, que debate temas como arte e cultura. Alguns nunca ouviram falar dele, alguns não o conseguem entender, no entanto como diz o próprio Anitelli “ O Teatro Mágico não é pra se entender ,O Teatro Mágico é pra se sentir, para se viver.”
Assim sendo, O Teatro Mágico adquire nuances de alimento. Como já disse em outras ocasiões, minh’alma tem fome de poesia e eu adoro sopa de letrinhas. Fernando Anitelli é um excelente gourmet e nos oferece iguarias ímpares, uma vez que somos um exemplar apenas de cada um de nós,uma vez que estamos quase em extinção...
Não bebo. Sim! E estou vivendo. Só que viver, às vezes dói. Dói a constatação da manipulaçao, da traição, da falsidade. Dói a decepção de acreditar no ser humano e saber-se ridículo por isso, mas decepções em mim só doem quando respiro e daí, volta Anitelli me consolando “só enquanto eu respirar, vou me lembrar de você”.
Do vinho mesmo não dou noticia, mas a programação musical é, geralmente, impecável. Coisa para pessoas de bom gosto e refinado paladar musical. Os melhores shows aos quais estive presente foram lá, na Pequenópolis Catas Altas.
Atmosfera convidativa ao aconchego, pé de serra, casario histórico, igrejas seculares, vinho, gente bonita e musica de boa qualidade. Ingredientes perfeitos para o sucesso da festa.
Verificando a programação deste ano, uma sensação de êxtase tomou conta de algum lugar dentro de mim ao constatar o encerramento com O Teatro Mágico. O Teatro Mágico é uma mistura de circo, poesia e discussões políticas, que debate temas como arte e cultura. Alguns nunca ouviram falar dele, alguns não o conseguem entender, no entanto como diz o próprio Anitelli “ O Teatro Mágico não é pra se entender ,O Teatro Mágico é pra se sentir, para se viver.”
Assim sendo, O Teatro Mágico adquire nuances de alimento. Como já disse em outras ocasiões, minh’alma tem fome de poesia e eu adoro sopa de letrinhas. Fernando Anitelli é um excelente gourmet e nos oferece iguarias ímpares, uma vez que somos um exemplar apenas de cada um de nós,uma vez que estamos quase em extinção...
Não bebo. Sim! E estou vivendo. Só que viver, às vezes dói. Dói a constatação da manipulaçao, da traição, da falsidade. Dói a decepção de acreditar no ser humano e saber-se ridículo por isso, mas decepções em mim só doem quando respiro e daí, volta Anitelli me consolando “só enquanto eu respirar, vou me lembrar de você”.
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