Regina Célia é escritora, formada em Letras, membro da AMULMIG _ Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, autora dos Livros Gangorra e Ad versos, alem de crônicas publicadas em jornais e em posts.

domingo, 13 de outubro de 2013

Nêga





Hoje me peguei a contemplar uma relíquia que adquiri, por presente,  há alguns anos: uma máquina de escrever, de ferro, pesada pra caramba, pretinha e ... Linda! Estava em companhia de outras, sucateadas pelo tempo e substituídas por modernos computadores. Funciona perfeitamente, embora não seja utilizada. Batizei-a por Nêga, num plágio descarado da musica “Meu Caro Barão”, do Chico Buarque em Os saltimbancos Trapalhões.

A Nêga despertou-me paixão à primeira vista! Não sei se era ela ou alguma prima-irmã, mas ia eu pelos 6, 7 anos, no máximo, quando me encantei por aquele equipamento maravilhoso. Apavorada com a idéia de ir ao dentista, na sede do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de Barão de Cocais , fiquei a admirar  a rapidez com que as funcionárias escreviam naquilo. Minha irmã mais velha trabalhava lá. Fantástico! Pensei: quero aprender também. Ali eram ministradas aulas de datilografia que, por certo, eu desejava fazer tão logo tivesse idade para tal.

Eram tec, te tecs infindáveis intercalados com um “tlim”, que posteriormente vim a saber tratar-se do final da linha datilografada. Em poucos minutos a folha imaculada saía repleta de palavras, num encaixe perfeito, às vezes completado por um apóstrofo marcando a adequada margem do papel. Coisa linda de se ver!

A minha freqüência ao local tornou-se prazerosa por vários motivos, mas um deles eram as máquinas de escrever. Eu não as tocava, mas já chegava bem pertinho e apenas vê-las e ouvi-las enchia o meu coração de pura satisfação.

Ao lado da minha irmã trabalhava uma moça bonita, de saias curtas e pernas grossas. Era uma exímia datilógrafa. Sempre muito simpática e sorridente. Em pouco tempo eu a admirava também.

Descobri, anos depois,que a moça das pernas grossas era uma pessoa  especial não apenas por ser bonita, simpática e exímia datilógrafa, mas  por se tratar da primeira mulher a ocupar o cargo de prefeita no estado de Minas Gerais.

Ao divagar nessas lembranças, vejo que a minha relação  com a Nêga é de encantamentos recíprocos. Ela também se encanta com a minha existência! Sinto como se ela piscasse o olho pra  mim todas as vezes que a faço repetir o “tlim”que me evoca doces memórias.A propósito, não fiz o curso de datilografia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário