Regina Célia é escritora, formada em Letras, membro da AMULMIG _ Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, autora dos Livros Gangorra e Ad versos, alem de crônicas publicadas em jornais e em posts.

domingo, 5 de junho de 2011

Sonhicídio



De parto dorido e acalentada espera precipita-se pela razão a gnose do nascimento de um sonho. Um sonho gerado a contra- gosto, concebido sem planejamento e com todos os quesitos para uma condenação natural, mas ao mesmo tempo um sonho amado muito antes de haver sido fecundado, um sonho que transcende os tempos e que vagou inconsciente e inconseqüentemente pelo cosmos por mais de uma dezena de anos até encontrar espaço onde fazer morada. E deu de cismar comigo. Logo eu que tanto me precavi? Eu que me gabava de sonhar apenas quando queria ou quando dormia? Em que momento de fragilidade vacilei a ponto de sonhar tanto? Porque minhas investiduras abortivas não funcionaram? As dúvidas retornam a cada pulsar cardíaco- respiratório como contrações... O sonho é que parece agora não querer mais nascer.

Gerado em acalentados silêncios um novo sonho adquire sinais de vida. Nem os estudiosos da psique nem a mais cortejada plêiade conseguiram diagnosticar a placenta dos sonhos e as alternativas que se nos propõem encontram-se no coração ou no cérebro. Nada há entre um local e outro...somente as dúvidas permanecem e a espera é, geralmente, um misto de dor e gozo, um prazer que faz sofrer, um doer que faz gostar...

Muitas tentativas de assassinatos de sonho são cometidas durante sua gestação. Às vezes em nome da moral, às vezes em nome do preconceito, do imerecimento ou do medo... Alguns sobrevivem . Simplesmente sobrevivem e, a certa hora, é mister que nasçam.

A noite estrelada cintila como gotas de orvalho em folhas de taioba. Singela metáfora ruralista em que não se coube verso... A lua disforme em sua minguante aparência aparece zombeteira semeando uma pálida luz azulada sobre minha face, carente de todos os benefícios dos raios solares da manhã. O ventre, incorrigivelmente saliente, não traz consigo nenhum projeto de estrela, nenhuma lua nova, crescente ou cheia, nenhuma vida futura... Os sonhos não nascem do ventre.


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*Texto recuperado. Escrito e publicado por mim em algum lugar e tempo passados. Atualizado para o blog.

2 comentários:

  1. Sonhos nao nascem do ventre. Perfeito!

    Marilaine Borges - Catas Altas

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  2. Um sonho, um amor possivel... Um sonho, você!

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